6.4 Branch e merge
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Uma coisa que o GitLab (e outros sistemas baseados em git) fazem é controlar e rastrear as alterações que são feitas nos arquivos de um repositório. Por exemplo, suponha que você precise alterar a versão do Flask, pois detectou que uma nova funcionalidade deve ser introduzida no projeto. Para isto, basta alterar o arquivo requirements.txt
:
Uma vez que o arquivo está salvo, a mudança já passa a ser detectada pelo git. Execute o comando git status
, e veja como o arquivo requirements.txt
aparece como modificado:
Para enviar essa modificação ao repositório, primeiro precisamos confirmar que desejamos que essa alteração entre no próximo commit (confirmação de mudança). Execute:
O comando git add
marca um arquivo como adicionado ou alterado. Similarmente, o git remove
marca um arquivo como removido.
Ao executar git status
novamente, a mudança aparece. Após revisar, para confirmar, execute:
É recomendável definir uma mensagem que descreve a mudança. No git (e em outros VCS) é importante documentar sempre, e descrever todas as alterações, por menores que sejam. Assim, o rastreamento proporcionado pelo sistema pode se converter em informações valiosas para o futuro.
Ao invés de marcar as alterações individualmente e somente após isso confirmar, é possível pedir ao git que detecte as mudanças e automaticamente marque tudo para envio. Isso pode ser feito adicionando o parâmetro "a" no comando git commit
:
Porém, isso não funciona para arquivos novos, que precisam ser manualmente reportados pelo git add
.
O commit não significa que as mudanças já foram enviadas para o repositório no GitLab. O git é um sistema distribuído, feito para que haja múltiplas cópias em múltiplas máquinas. Assim, até o momento, a máquina local contém a mudança, confirmada. Mas o servidor do GitLab ainda não recebeu essa nova versão (acesse lá e veja). Para sincronizar as versões, é necessário executar um comando push
:
Agora sim, ao acessar o GitLab, você verá que o arquivo foi alterado. Também aparece, logo na página inicial, que houve um commit:
E clicando sobre a mensagem, é possível ver os detalhes deste commit (todos arquivos alterados, onde foi feita alteração, etc.):
Claro, existem inúmeras complicações que podem ocorrer. Múltiplas pessoas podem tentar alterar o mesmo arquivo ao mesmo tempo, causando conflitos. Isso requer uma análise individual para manter os artefatos consistentes. Mas não entraremos nesses detalhes aqui.
O ponto principal é: essa alteração foi simples, não foi? Mas em projetos maiores, a quantidade de arquivos alterados em cada commit pode ser enorme. Além disso, pode levar um longo tempo entre o início de uma alteração e a sua confirmação. No exemplo, ainda seria necessário testar a nova versão do Flask, atualizar o código, verificar que está tudo funcionando, entre outras tarefas. Imagine que essa mudança leve, por exemplo, uma semana do seu trabalho. Durante essa semana, você alterou vários arquivos, trocou conteúdo diversas vezes, experimentou, criou, apagou, e fez várias mudanças. Veja só em que conflito isso pode chegar.
De um lado, idealmente, toda e qualquer pequena alteração deve ser enviada ao VCS, ainda que seja um pequeno trecho de um arquivo. Além de permitir uma melhor rastreabilidade, isso garante que haja mais pontos de restauração, caso você decida voltar atrás. Imagine que você ficou três dias trabalhando, modificou 60 arquivos diferentes. Aí, no meio do caminho, você percebe que 30 desses arquivos não deveriam ter sido alterados (errar é humano, não se culpe!). Se você tiver registrado essas alterações aos poucos, poderia restaurar o estado do seu código, revertendo até uma versão de onde pode retomar seu trabalho e seguir novamente em frente. Mas se você não registrou nenhuma alteração, precisará voltar do início e refazer muito do que já fez.
Do outro lado, existe o problema de potenciais conflitos. Sempre que mais do que uma pessoa trabalha em um mesmo conjunto de arquivos, há a possibilidade de duas pessoas alterarem o mesmo arquivo no mesmo tempo. Se você estiver trabalhando em um projeto sozinho, tudo bem. Mas e se estiver trabalhando em equipe? E se tiverem outras pessoas trabalhando em outras mudanças, nos mesmos arquivos? E se ambos estiverem em tarefas longas de atualização? A quantidade de conflitos decorrentes de alterações simultâneas será enorme e potencialmente catastrófica. Portanto, neste caso ficar fazendo commits a todo momento é ruim.
Como resolver esse dilema? Fazer commits a todo momento? Ou deixar para fazer commits somente no final de uma tarefa? Nenhuma opção é a ideal.
Uma solução aceitável e que fica no meio-termo é a seguinte: sempre que for trabalhar em uma alteração, crie uma cópia do repositório, e trabalhe nesta cópia. Esta cópia é exclusivamente sua, portanto pode fazer commits à vontade, quantos quiser. Assim que estiver satisfeito, faça o merge (junção) dessa cópia com o repositório original. Caso haja várias pessoas trabalhando juntas, vai haver conflitos provavelmente. Mas terá muito menos do que se as mudanças fossem feitas na mesma cópia. Além disso, os conflitos aparecem somente no momento do merge, portanto é possível que a equipe se planeje para resolver os conflitos uma única vez, ao invés de a todo momento.
No exemplo até o momento, estivemos trabalhando na mesma cópia, chamada de "main". No git, cada cópia é chamada de "branch" (ramo ou galho), pois é como se a história de evolução do software se ramificasse em um determinado momento. Na página inicial do projeto, no GitLab, é possível ver que temos apenas um "branch", e que os dois commits foram feitos nele:
Problemas e melhorias aparecem a todo momento em um projeto de software. Seja a descoberta de um bug, ou a percepção de algo deve ser melhorado, ideias podem ser propostas por qualquer envolvido no projeto, desde usuários até desenvolvedores.
Por exemplo, o leitor mais preocupado pode ter percebido que, neste projeto, não incorporamos qualquer tipo de teste automatizado no nosso aplicativo. Seria ideal que tivéssemos isso implementado, não? Como fazemos para avisar aos desenvolvedores que isso é algo que requer atenção?
No GitLab (e em outros sistemas parecidos), há um sistema de questões a serem resolvidas. São normalmente chamadas de issues, um termo em inglês que denota que há algo a ser investigado, analisado, e que pode ser um problema. Vamos criar um novo issue para nosso projeto.
Acesse o menu, no GitLab, indicado com Issues, e clique em "New Issue". Dê um título, como "Testes unitários são necessários", e descreva a questão como achar melhor. Quando estiver pronto, clique em "Create issue".
O novo issue aparecerá na lista, e permanecerá aberto até que alguém o resolva. Ele também recebe uma numeração sequencial, neste caso é o número 1 (pois é o primeiro).
Vamos criar outro? Não seria bom se nosso aplicativo tivesse uma página inicial? Lembre-se, hoje ele somente possui uma página chamada cadastro.html
. Faça isso, use título e descrição como achar melhor.
Temos agora dois issues esperando para serem resolvidos. Vamos a seguir fazer isso conforme as boas práticas do controle de versões usando git.
O que precisamos fazer, sempre que há um novo issue, é:
Criar um branch para trabalhar nesse issue
Obter uma cópia deste branch na máquina local
Resolver o problema, adicionar a nova função, ou o que quer que tenha sido reportado. Isso envolve também testar e garantir que está funcionando, pelo menos localmente
Enviar as alterações para o repositório
Fazer o merge do branch de volta ao conteúdo principal
Apagar o branch
A forma mais simples de começar esse processo, usando o GitLab, é pela página de issues. É possível criar branches usando a linha de comando, mas pela página há algumas facilidades. Acesse o issue dos testes unitários, encontre o botão que diz "Create merge request", clique-o, mas altere-o para "Create branch", e confirme:
Ao fazer isso, um novo branch será criado, e irá aparecer na lista de branches do projeto:
Se tivéssemos escolhido a opção "Create merge request and branch", o GitLab teria criado o branch e também já deixaria criado o merge request, que é algo que teremos que fazer mais para a frente. Mas aqui, como estamos ensinando o passo-a-passo, vamos fazer uma coisa de cada vez. Você provavelmente irá, na maior parte do tempo, usar a opção que já cria as duas coisas de uma única vez.
Como comentado anteriormente, seria possível fazer isso via linha de comando. Mas assim, o GitLab já adianta algumas coisas:
Ele já dá um nome automaticamente para o branch, associando-o ao título do issue que o originou
O branch fica vinculado ao issue, de forma que quando você acessa o issue, é possível ver o branch associado, o que facilita o controle.
Já estamos prontos para trabalhar nesse issue. Para isso, precisamos obter uma cópia deste recém-criado branch, afinal queremos trabalhar em nossa própria cópia do repositório, evitar conflitos, correto? Para fazer isso, precisamos sincronizar nossa pasta local com o GitLab. Afinal, criamos o branch pela página, portanto a mudança ainda não aparece localmente. Para isso, execute:
Veja como o nosso novo branch foi detectado na saída do comando:
Agora podemos mudar para esse branch com o comando:
Pronto, a partir de agora, todas as mudanças que forem feitas serão adicionadas a esse branch, mantendo o original (chamado main) intacto até que façamos um merge.
Agora vamos resolver o problema, ou seja, vamos criar um conjunto de casos de testes para nossa API. Existem várias formas de fazer isso, mas seguiremos de um jeito simples. Crie um novo arquivo no projeto, chamado test_api.py
:
Esse código faz uso do pacote padrão do Python para testes, chamado unittest
. Criamos quatro casos de teste, um para cada categoria de produtos do nosso modelo. Para rodar, basta executar o seguinte comando (Não esqueça de criar ou ativar um ambiente virtual, para não poluir a instalação global do Python em sua máquina):
A instalação foi necessária pois atualizamos a versão do Flask, para funcionar com esse código que foi construído.
Tudo deve funcionar corretamente, e devemos ver os casos de teste bem-sucedidos.
Satisfeitos com as mudanças, vamos portanto confirmá-las. Lembrando que agora estamos trabalhando no branch criado especificamente para esse issue, execute:
Estamos prontos para fazer o merge deste branch de volta. Porém... algo aconteceu!
Enquanto um desenvolvedor especialista em testes trabalhava nos casos de teste, outro desenvolvedor, especialista em front-end, resolveu atacar o issue da página principal. Assim como no exemplo anterior, ele criou um branch para o issue número 2. Vamos simular essa situação?
Primeiro vá ao GitLab e crie um branch para o issue número 2, como fizemos anteriormente.
Agora, na sua máquina, crie uma nova pasta, completamente separada da que estamos trabalhando até agora (é como se fosse uma pasta na máquina de outra pessoa). Execute o comando para obter uma nova cópia do repositório (substitua pelo seu usuário/projeto/branch):
Não se esqueça de criar/ativar um ambiente virtual, e instalar os requirements.
A primeira coisa que podemos reparar é que nessa nova pasta não existe o arquivo test_api.py
, pois o mesmo não existe no branch em questão. Porém, o arquivo existe e foi salvo. Experimente rodar git switch
para o outro branch e você verá o arquivo aparecer. Não esqueça de retornar ao branch do issue número 2.
Neste momento, é importante ressaltar que você precisa, a todo momento, certificar-se de que está trabalhando no branch correto. Use o comando git status
para conferir. Além disso, a maioria dos editores com suporte a git tem algum tipo de apoio visual. No Visual Studio Code, por exemplo, o branch ativo aparece na janela principal:
Então vamos resolver o problema. Era uma página inicial que faltava, certo? Basta criar um novo arquivo, chamado index.html
, dentro de webclient
, junto com cadastro.html
:
Vamos testar. Nosso Dockerfile
já está configurado para copiar todos os arquivos dessa pasta (confira lá!), portanto não precisamos mexer em mais nada. Basta construir a imagem e executá-la.
Obs: caso haja problema na execução, verifique se os arquivos estão sendo salvos com terminação de linha padrão Linux. Caso seja padrão Windows, pode ocorrer erro.
Abra o navegador e acesse: http://localhost
e veja que funcionou. Não vamos ganhar nenhum prêmio de web design, mas já é o suficiente para resolver o issue!
Podemos então seguir com o processo, confirmando e enviando as alterações para o GitLab:
Temos agora três branches no repositório:
main
: código utilizado para inicializar o repositório
1-testes-unitarios-sao-necessarios
: cópia criada para resolver o issue 1
2-falta-uma-pagina-inicial
: cópia criada para resolver o issue 2
Também temos uma série de 4 commits no repositório. Dois deles no branch main, e um em cada branch. É possível ver esses commits no gráfico que é exibido ao clicar em "Repository" -> "Graph":
Nessa imagem, é possível ver o histórico de commits, e o branch onde cada commit ocorreu.
Vamos então fazer os merges desses branches. Novamente, é possível fazer tudo isso em linha de comando, mas pelo GitLab as informações ficam melhor organizadas, e associadas aos issues que os originaram.
Vamos começar pelo issue 1. Acesse a página de branches, selecione o branch associado ao issue 1, e selecione o botão "Merge request":
Na página que for aberta, digite um título e uma descrição, se quiser explicar algo que julgar necessário. Certifique-se que a opção "Delete source branch when merge request is accepted" está selecionada. Isso irá automaticamente apagar o branch assim que o merge for bem sucedido. Essa decisão é opcional, mas ajuda a manter o repositório livre de branches antigos.
Faça o mesmo processo para o outro branch.
Assim que os "Merge requests" forem criados, ele irão aparecer na área "Merge requests" do GitLab.
Vamos agora aceitar os requests. Mas antes, é importante lembrar que estamos aqui imaginando um ambiente com múltiplos desenvolvedores. As pessoas que efetivamente implementaram as mudanças e que criaram os "merge requests" não necessariamente serão as mesmas pessoas que aceitarão as mudanças. Possivelmente há uma pessoa responsável somente por aceitar esses requests. Assim, é plausível imaginar que essa pessoa não tem o código em sua máquina. Também é plausível imaginar que ela queira revisar o que está sendo alterado antes de aceitar o request.
É possível simplesmente obter uma cópia do repositório, fazer o git switch
para o branch, e revisar. Mas o GitLab tem uma interface que facilita esse processo. Vamos lá.
Entre em um dos merge requests e clique no botão "Open in Web IDE":
Na página que se abrir, será exibida a estrutura de arquivos, com um ícone que indica o que foi alterado, neste caso o arquivo test_api.py
.
Clicando sobre o arquivo alterado, será exibida uma comparação, linha a linha, do que mudou. Neste caso, o arquivo não existia antes, então a diferença consiste em todas as linhas sendo adicionadas.
Assim que estiver satisfeito com as mudanças, volte à página anterior e clique em "Merge":
Assim que o processo for concluído, acontecerá o seguinte:
As alterações serão incluídas no branch principal
O merge request irá desaparecer da lista
O issue associado irá desaparecer da lista 4, O branch criado será removido (pois dissemos para o GitLab fazer isso)
Faça o mesmo com o outro branch.
Agora acesse novamente a área de gráfico. Veja o resumo do que fizemos até agora:
Veja como houve duas bifurcações (branching), duas junções (merge), e como cada commit adicionou mudanças. Agora temos novamente um único branch, que incorpora todas as mudanças realizadas.
Se quiser, você já pode apagar todas as cópias locais e fazer um novo clone
do repositório, e assim terá a versão mais recente. Ou, se quiser permanecer com uma cópia, apague uma delas, e execute os seguintes comandos na outra:
Veja como agora a pasta contém as duas alterações feitas: o arquivo de testes e a página inicial.
O processo que fizemos aqui foi bastante simplificado, mas ele representa as boas práticas do controle de versões usando git. É claro que, na maioria das vezes, a quantidade de alterações será maior, a quantidade de issues será maior, haverá conflitos, entre uma série de complicações. O importante é sempre manter as informações organizadas, adicionar comentários informativos, e documentar tudo o que for essencial.